domingo, 15 de março de 2009

A luta pelo direito à cidade é uma luta contra o capitalismo

foto: marciacsilva.wordpress.com



Conferência do geógrafo David Harvey
na Tenda da Reforma Urbana Kazuo Nakano

FÓRUM SOCIAL MUNDIAL – BELÉM – PA


A luta pelo direito à cidade é uma luta contra o capital. Há um estreito relacionamento entre o capital e os processos de construção das cidades. (...)

Nos últimos 30 anos houve uma enormidade de crises financeiras. Desde 1970 houve 397 crises financeiras no mundo. Entre 1945 e 1956 foram 56 crises. Muitas dessas crises têm sua base nos processos de urbanização. Em 1997, uma crise nos EUA fez com que 300 bancos americanos entrassem em falência. Eram bancos que especulavam no mercado imobiliário. Eram crises causadas por especulações imobiliárias com recursos do mercado financeiro. Nos últimos 30 anos todas as crises financeiras tiveram sua origem nas especulações imobiliárias. (...)

Para Harvey, o que vemos hoje não é somente uma crise financeira e no mercado de hipotecas norte-americano. Trata-se de uma crise urbana. Na década de 90, o superávit financeiro foi utilizado na exploração da mão-de-obra e na obtenção de meios de produção. Há sempre produção de superávits de capitais que financiam a expansão do capitalismo. Há sempre o problema de encontrar formas lucrativas para aplicar esses excedentes de capital, frutos do crescimento econômico. Esses superávits são usados em re-investimentos induzidos pela concorrência. Hoje, a China impulsiona o crescimento do capitalismo no mundo. Desde 1970 há menos investimentos em novos meios de produção e mais investimentos em imóveis e terras. A valorização desses ativos, em especial o encarecimento dos imóveis urbanos, assegura ganhos de capital. (...)

Esse processo interdita a efetivação do direito à cidade, principalmente para os mais pobres que são cada vez mais expulsos para locais distantes, pois não possuem meios para acessar os melhores espaços urbanos. A partir da década de 70, o neoliberalismo provocou depressões salariais que aprofundaram esse processo de interdição do direito à
cidade. (...)

Essa dinâmica de investimentos de capitais na produção e comercialização de espaços urbanos e a conformação daquela “economia da dívida” revelam a crescente mercantilização da cidade que desembocou na crise global atual. Os impactos dessa crise estão sendo profundamente desiguais. As execuções hipotecárias causadas por inadimplências afetam principalmente os mais pobres que vivem nas partes mais precárias e antigas das cidades americanas. (...)

Contraditoriamente, a injeção de recursos públicos é mais para salvar o sistema financeiro e resgatar os agentes do capital do que para garantir os direitos sociais prejudicados pelos efeitos da crise. Os bônus obtidos pelos altos executivos das instituições financeiras que quebraram e receberam ajuda governamental chegam à casa das centenas de bilhões de dólares e superam, em muito, os recursos públicos usados para ajudar aqueles que perderam suas casas. Em muitos locais, as casas hipotecadas que foram confiscadas são utilizadas em pacotes financeiros e não em políticas públicas voltadas para garantir o direito à cidade e à moradia digna. (...)

No Brasil, esse alerta feito por Harvey deve ser levando em conta para criticarmos a disseminação de loteamentos fechados e a chamada “urbanização dispersa” que induz a produção de espaços urbanos de baixa densidade em áreas distantes das cidades.
Daí a importância e a urgência de fortalecer a militância dos movimentos sociais. O que vale mais, as instituições financeiras ou as pessoas? Temos que enfrentar o problema de absorção dos excedentes de capital. O crescimento econômico, puro e simplesmente não é a solução, pois, dependendo do modo como ocorre, pode provocar pressão imensa sobre o meio ambiente do planeta. Se não trabalharmos para enfrentar as crises sistêmicas atuais em profundidade, viveremos processos em que sairemos de uma crise para outra. (...)




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